Quem diz “Je ne suis pas Charlie” presume que a caneta gera o ódio que mata gente. Trata-se do contrário do que teria dito Charb: “Com uma caneta eu não degolo ninguém”.
Concordo em parte, pois grandes carnificinas da nossa história foram justificadas — e principiadas — a partir de livros de autores como Marx, Hitler, Sun Tzu, Maquiavel e outros. Eles inspiraram os tiranos mais sanguinários da nossa história, com a exceção de Hitler, que inspirou a si mesmo.
No entanto, por mais trágico que isso possa parecer, não acredito que devamos censurar nem Marx, nem Hitler, nem Maquiavel, nem Sun Tzu, nem a Charlie Hebdo. Se fizéssemos isso, não haveria quem os refutasse ou quem discordasse destes.
Ao garantir que todos tenham acesso a opiniões adversas, fica mais claro o entendimento de que não agredir o outro é o princípio fundamental da convivência.
Respeitar a vida alheia é fundamental. A única forma de fazer isso é não agredindo outra pessoa, nem lhe tomando nada.
A liberdade de expressão precisa superar o politicamente correto para que cessemos os nossos conflitos em vez de aumentá-los.
Engana-se quem acha que piadas politicamente incorretas geram ódio. O que gera ódio é você não poder falar o que pensa, não expressar o que sente, não fazer o que quer e não debater com quem pensa diferente para não aceitar outras opiniões.
O que mais se vê por aí são pessoas que buscam ofender o adversário em vez de debater ideias. Isso é o resultado do chamado “politicamente correto”, que permite que essas pessoas se achem no direito de criticar os outros em vez de suas ideias, para que a auto-censura se estabeleça como um vírus na cabeça das pessoas.
Trata-se de um exercício contínuo de dominação da consciência.
Hoje o fundamentalismo islâmico mata. Fazer piada com ele é mais do que necessário. Apenas no campo das ideias se combate o fundamentalismo. Está mais do que provado que matar terroristas só vai gerar mais crianças terroristas. Fazer piadas que afetem os terroristas irá ridicularizá-los e eles perderão força mental e espiritual.
Transferiremos o campo de batalha para o das ideias e lá eles perderão magistralmente.
O mesmo processo aconteceu com a Igreja Católica e a sua Inquisição — também fundamentalista, censora e criminosa. Aos poucos a Igreja Católica foi se tornando menos fundamentalista, foi queimando menos livros e bibliotecas e reconheceu os abusos a Galileu, Copérnico e outros. Nem mesmo a Igreja Católica pode resistir a ideias tão grandiosas desses gênios.
Ideias livres funcionam como vírus fatais para quem possui ideais de dominação do próximo.
Os fundamentalistas também não resistirão às piadas de Charlie Hebdo. E assim o mundo aprende que é com mais liberdade e luz que se combate a ignorância e a escuridão.