“Há muito tempo existia no país de Serendippo, no Oriente, um grande e poderoso rei que tinha o nome de Giaffer. Ele tinha três filhos que eram muito amados. Sendo um bom pai, preocupado com a educação deles, decidiu que eles tinham de herdar não somente grande poder, mas também todos os tipos de virtudes, das quais os príncipes particularmente necessitariam.” Início da história de Os três príncipes de Serendip
Serendipidade é a arte de encontrar o que não se busca. A possibilidade de chegarmos a algum evento de serendipidade é proporcional ao quanto buscamos. A inércia, a anestesia e ficar parado pode nos levar a não conhecer pessoas, não encontrar aventuras e não conhecer histórias que jamais teríamos conhecido se não fosse a atitude de buscar.
A história dos três príncipes de Serendip é recheada de momentos assim. Após o pai enviar os filhos para os melhores tutores, resolveu fazer com eles um teste: disse que um deles deveria assumir o trono concluído o treinamento.
Os três filhos, polidamente, recusaram, dizendo que o pai tinha mais sabedoria e conhecimento para governar que eles jamais teriam. O pai, temendo que a educação dos filhos tivesse sido muito privilegiada, simulou estar com raiva deles e os expulsou de seu país.
Os príncipes passaram a encontrar aventuras das mais diversas enquanto peregrinavam. Numa delas, concluem como estava um camelo perdido a partir de pistas. Quando vão falar com o dono do camelo, o dono acusa os três príncipes de terem roubado o seu animal. Durante a investigação do caso, os oficiais de justiça queriam saber como os três príncipes sabiam detalhes de um camelo que jamais haviam visto. E eles explicaram que conseguiram os detalhes por meio de pistas que obtiveram. Em seguida, um homem chega e diz que avistou o camelo perdido no deserto. Os três príncipes foram soltos, ganharam uma recompensa e conseguem um cargo de conselheiros.
Essa estória, por mais aleatória que seja, serve para lembrarmo-nos de que a vida é recheada de momentos assim. Por vezes estamos lendo um livro e encontramos uma ideia para solucionar um problema. Ou então alguém pode encontrar o amor de sua vida enquanto fazia compras. A vida precisa de momentos assim e é feita de momentos assim. Daí a graça de se viver com liberdade.
Quando se vive num país sem liberdade, seja uma teocracia ou uma ditadura socialista, a sensação que se tem é que o tipo de serendipidade que se vai encontrar ao buscar alguma coisa é a desgraça. Nos últimos anos, venezuelanos têm saído para ir às compras e encontrado mercados vazios. Voltam para casa com o dinheiro e ainda acabam sendo assaltados. Essa triste realidade é o lado da vida que ninguém quer. Mas isso não é serendipidade. Pois como já dizia Louis Pasteur:
“A sorte só favorece as mentes preparadas” – Louis Pasteur
Serendipidade só existe quando há liberdade. Ela permite a descoberta científica de novos medicamentos. Como não lembrar como Alexandre Fleming descobriu a penicilina observando o comportamento e o resultado de pacientes que comiam pão embolorado e não ficavam doentes de pneumonia. Associando essa descoberta ao fungo que havia no pão, Fleming elaborou a penicilina. Uma descoberta simples a partir de um fato natural.
Outro caso emblemático teria sido a maçã que caiu próxima de Isaac Newton. Gerando um insight poderoso, aquele fruto permitiu que parte da física, sobretudo da física de nosso planeta, fosse desvendada por aquele homem genial. Outras descobertas importantes foram feitas dessa maneira: buscando alguma outra coisa e chegando em outra.
Para que viver com liberdade valha a pena, é preciso que tenhamos a chance de encontrar a serendipidade nos caminhos que buscamos. E é preciso, sobretudo, buscar as aventuras da vida. Sempre com ternura e buscando uma forma de conviver com segurança. Do contrário haveremos de nos encontrar com o tenebroso, em vez do valoroso. E é isso o que serendipidade quer dizer.
